Quer tomemos ou não drogas lícitas ou ilícitas, estamos todos dopados. A vida que levamos, a comida que comemos, o escape que encontramos nas telas, nas bebidas ou na excitação social, está nos deixando absolutamente dopados em nossas emoções, capacidade de sentir, sensações e conexão com o sentido maior da vida!
É a segunda vez que vivencio um processo ‘detox’ da Ayurveda (medicina indiana, a mais antiga do planeta) chamado ‘Ama Pachama’, que consiste em 7 dias de uma dieta alimentar bastante rigorosa, baseada no consumo de arroz basmati, típico indiano, com determinadas especiarias e chás também específicos – os detalhes não são importante pois meu objetivo não é ensiná-los o ‘Ama Pachama’, pois para isso devem procurar uma terapeuta Ayurveda.
Meu ponto é compartilhar um pouco dessa experiência que me mostrou claramente como estamos dopados no nosso dia-a-dia. Os primeiros dias do processo – aconteceu muito parecido nas duas vezes – são muito difíceis. Não pela restrição alimentar, que eu particularmente achei muito interessante pelo fato de não ter que me ocupar/preocupar com o que comer, pois a escolha/decisão consome muito da nossa energia na vida, então é aquilo e pronto; ou pela fome, como se poderia imaginar, porque não há fome; mas sim pela limpeza emocional que sinto.
Enquanto o corpo vai limpando, a sensação que eu tenho é que também a mente, a psique, vai limpando. De muitas sujeiras que, diferentemente do que sentimos no corpo, onde é mais fácil perceber a intoxicação pelas dificuldades de digestão, doenças, dores ou incômodos em geral, não sabíamos que estavam ali. Ou pelo menos não tínhamos consciência.
Eu choro quase sem parar nos primeiros 3 dias do processo. Vem tanta tristeza! Pensamentos super negativos, medos, aflições, completa falta de conexão e fé… nas duas vezes cheguei à beira de pensamentos suicidas (não na prática, claro que não, pois eu absolutamente não tenho essa tendência, pelo contrário, sou uma pessoa super otimista e com muita fé na vida!)! Mas tem ideia do que seja a sua mente ficar rodando em círculos de pensamentos negativos, como se a vida não fizesse sentido nenhum? Como se nada, nada, nada fizesse sentido… não houvessem alternativas felizes para a vida, sua e de toda a humanidade?… não houvesse a menor possibilidade de leveza e alegria? Pois é assim que me senti nas duas vezes…
Depois, como que por um milagre, no amanhecer do quarto dia tudo começa a mudar… e vai num crescendo… o sentimento de alegria, de conexão com a natureza e com algo maior, as cores, os sons, os sabores, tudo parece completamente diferente… o olhar fica mais sensível para tudo ao redor.. a vida ganha um sabor, um sentido, difícil explicar… tudo parece fazer sentido agora. A existência em si mesma. Simples!
Desta segunda vez, talvez por estar longe da minha casa (onde estava na primeira), longe da minha rotina de maternagem, retirada sozinha numa cabana junto à natureza na Patagônia Argentina, tive a oportunidade de perceber com maior clareza todo o processo.
É como se com a vida que levamos – e estou falando desse modelo de vida nas cidades, corrida com mil afazeres, cercada de tecnologia por todos os lados, sem tempo para se alimentar bem, dormir bem, exercitar-se, contemplar a vida… – estivéssemos não apenas sobrevivendo, mas pior do que isso, entramos num círculo vicioso terrível de buscar uma ‘utilidade’ na vida. Como se em algum momento, ao chegar em algum lugar, a vida fosse fazer sentido… e assim perdemos completamente o sentido da vida, que está aí para ser vivida, por si mesma, apenas vivida, desfrutada, experienciada em todos os seus sentidos!
Tenho certeza que os pensamentos e sentimentos ‘horríveis’ que me apareceram nos primeiros dias do ‘detox’ também aparecem timidamente no meu dia-a-dia, mas são encobertos pela correria e por todas as toxinas que estão no meu corpo e mente! E daí sigo ‘vivendo’.
Mas como tudo que não é sorvido e compreendido conscientemente, fica no quarto escuro da psique, onde se avoluma e deturpa, e então segue inconscientemente incomodando, tirando, pouco a pouco, a graça, o sentido do viver, vai turvando nossa capacidade de sentir integralmente.
De verdade, precisamos repensar a forma como estamos vivendo. Dopados. Vida sem graça. Sem conexão. Com sentimentos escondidos por camadas e camadas de toxinas, que não nos permitem sentir alegria de viver, o sentido do viver! É o que eu sinto!
Do mato, na caminhada ao longo do Rio Hermoso, surgem essas lindezas, que em outro momento me teriam passado despercebidas!