É possível imaginar uma cena com alguém ficando muito bravo com o abacateiro porque seu fruto é o abacate e não a manga? Ou ver alguém rezando ao pé do abacateiro, implorando que ele dê manga ao invés de abacate? Parece óbvio que não, né?
Pode parecer óbvio quando olhamos para a natureza, mas parece tão parte da vida cotidiana que sigamos esperando das pessoas o que elas não tem para dar (como se estivéssemos pedindo para o abacateiro dar manga) e reagindo muito mal quando as pessoas não se comportam como gostaríamos, como esperamos, como achamos que é a forma certa de se comportar ou não se comportam como nos comportaríamos naquela situação, não?
Há algum tempo uso esse exemplo no consultório para ajudar a olhar para os relacionamentos tão difíceis nos nossos dias…
Quando espero que o abacateiro dê manga e o que ele me dá é abacate eu posso reagir com raiva, frustração, irritação, frieza… como que querendo fazê-lo entender que o que ele me deu não serve. Ora, mas eu posso afirmar que a manga serve e o abacate não?
O abacate pode servir melhor em alguns momentos que em outros, para algumas pessoas melhor que para outras… Exatamente assim como a manga. Para desfrutá-los é preciso reconhecê-los como aquilo que são.
Da mesma maneira precisamos reconhecer as pessoas como são e não como gostaríamos que fossem. Óbvio também! Mas quem de nós pode dizer que nunca nunquinha fica esperando que ‘abacateiro dê manga’ na vida real das relações interpessoais???
Ouço muito no consultório variações da seguinte frase: ‘nossa mas por quê ele/ela não pode fazer assim e não assado? Se é muito melhor?’ ou ‘nossa mas por que eu posso fazer e ele/ela não pode?’. Frases que mostram que estamos julgando o outro pela nossa régua; e nos esquecendo de olhar para o outro com suas potências, virtudes e não virtudes, específicas dele/dela… e que não tem necessariamente qualquer coisa a ver com as nossas.
Dr. Edward Bach disse algo assim: cada um de nós está nesta vida para aprender algo diferente; enquanto uns podem estar aprendendo a paciência outros podem estar aprendendo a generosidade, por exemplo… e se a paciência já for em mim uma virtude aprendida pode não ser para o outro que está na minha frente ou vice-versa…
Colocar consciência em quem é a pessoa com quem estou me relacionando na situação A, B ou C? Qual sua história? Família? Signo? Idade? Dores? Amores? Qual sua visão de mundo? E o que mais eu puder saber dependendo da intimidade que tenho… da qualidade da minha observação ao longo da convivência… do quanto consigo colocar o foco no outro e não em mim… muito nos ajuda no processo de nos relacionar.
Sinto que grande parte do processo de autoconhecimento é aprender a dialogar. Por incrível que pareça, se abrir ao diálogo, à simples troca de ideias; sem agenda, sem querer ganhar ou perder, sem medo, sem dizer o que eu não queria e não dizer o que eu queria… não é algo nada fácil nos dias que vivemos… (ou sempre talvez!?).
Gosto muito de uma fala atribuída à Einstein: ‘Se eu e você temos uma maçã e trocamos essas maçãs, cada um de nós sairá com uma maçã. Mas se eu tenho uma ideia e você tem outra ideia e trocarmos essas ideias, então, cada um de nós sairá com duas ideias’. Essa é uma das grandes riquezas da vida, eu penso!
É preciso aprender a conhecer o outro. E conhecer a si mesmo é o melhor caminho para isso. Nos vemos através dos outros, mas é sempre para nós que temos que voltar. O que isso fala de mim? Onde me pega? Quem sou eu? Em relação ao outro onde estou eu, nesse ou naquele assunto?
E todos os exercícios que vamos fazendo no processo de aprender a dialogar – ao invés de construir histórias nas nossas cabeças, cercadas de fantasias infantis -, nos ajudam a ampliar o espectro de compreensão do outro – e de nós, claro – nos levando a sentir a beleza do abacateiro assim como da mangueira! Aprendendo a escolher ora o abacate ora a manga ou nenhum dos dois para mim, na situação X ou Y…
Faz sentido pra você como faz para mim?
Se não espero de alguém algo diferente do que poderia esperar, não me frustro, não me irrito, não me distancio… crio oportunidades de dialogar, compreender e escolher se quero ou quanto quero compartilhar com aquela pessoa ou não.
Assim seguimos. Simples assim! 🙂